Tradução: A Vinda do Verme Branco, 4 (C. A. Smith)

Ao ver tal entidade a pulsação de Evagh se deteve por um instante, tal o terror e logo a seguir do terror as suas entranhas se revoltaram dentro dele, tal o excesso de nojo. Em todo o mundo nada havia que pudesse ser comparado à asquerosidade de Rlim Shaikorth. De alguma forma ele tinha a semelhança de um gordo verme branco, mas seu volume era maior que o de um elefante-marinho. Sua cauda espiralada era tão grossa quanto as dobras medianas de seu corpo e a sua frente se erguia do divã na forma de um disco branco sobre o qual estavam impressos vagamente traços que não pertenciam a nenhuma fera da terra ou criatura do mar. Nesse disco havia uma boca pálida e sem língua, curvada imundamente de lado a lado, abrindo e fechando sem parar até o bucho. As órbitas dos olhos de Rlim Shaikorth ficavam muito próximas, entre suas narinas rasas, e eram vazias, mas nelas apareciam momentaneamente glóbulos de matéria da cor do sangue e no formato de olhos, mas eles sempre se partiam e caíam diante do divã. E do chão gelado do domo se erguiam duas mas­sas como estalagmites, rubras e escuras como sangue congelado, que haviam sido criadas pelo incessante gotejar de tais glóbulos.

Dooni e Ux Loddhan se prostraram diante do ser e Evagh achou por bem seguir o seu exemplo. Curvado sobre o gelo ele ouvia as gotas vermelhas caindo com o ruído de lágrimas pesadas, e então, no domo acima de si, teve a impressão de ouvir uma voz, e a voz era como o som de uma catarata oculta em uma geleira escavada por muitas cavernas.

— Contempla, ó Evagh, — disse a voz — eu te preservei do destino de teus semelhantes e te tornei como os que habitam o reino do frio e inalam o vácuo sem ar. Sabedoria inefável terás também conhecimento além do que os mortais podem conquistar se concordares em apenas adorar-me e tornar-te meu servo. Comigo viajarás por entre os reinos do norte e passarás por entre as ilhas verdes do sul e verás a morte branca cair sobre todos a partir da luz de Yikilth. Nossa vinda tratará o gelo eterno a seus jardins e porá sobre a carne de seus povos o selo do abismo rigoroso que apagará cada uma das mais ardentes estrelas e leva geada ao coração dos sóis. Tudo isto testemunharás, sendo um dos senhores da morte, supremo e imortal, e no fim tu retornarás comigo àquele mundo além do último polo, que é o meu império. Pois eu sou aquele cuja vinda nem mesmo os deuses podem obstar.

Então, vendo que não tinha escolha, Evagh se comprometeu espontaneamente a adorar e servir o verme pálido. Sob as instruções de Dooni e Ux Loddhan ele desempenhou o rito de sete partes que faz pouco sentido narrar aqui, e pronunciou os três votos de inexprimível alienação.

Depois, por muitos dias e noites, ele navegou com Rlim Shaikorth pela costa de Mhu Thulan. Estranha foi a maneira de tal viagem, por parecer que o grande iceber era guiado pela feitiçaria do verme, prevalecendo sempre contra o vento e a maré. E sempre, dia e noite, como os raios de um farol da morte, o frio esplendor atingia tudo até a grande distância de Yikilth. Orgulhosas galeras eram ultrapassadas enquanto fugiam para o sul e as suas tripulações eram abatidas nos remos e, às vezes, navios eram capturados e incorporados aos novos bastiões de gelo que se formavam diariamente em torno da base daquela montanha sempre crescente.

Os belos portos hiperbóreos, cheios de tráfego marinho, foram paralisados pela passagem de Rlim Shaikorth. Quietas ficaram suas ruas e seus cais, quietas as cargas em suas baías depois que a luz pálida veio e se foi. Os raios chegavam profundamente ao interior, levando aos jardins e campos o murchar de um inverno transártico, e as florestas congelaram e os animais que as percorriam se tornaram também como mármore, de sorte que homens que passaram por aquele lugar muito tempo depois ainda achavam alces, ursos e mamutes ainda de pé em posturas vivas. Mas, vivendo sobre Yikilth, o feiticeiro Evagh estava imune à morte gelada. Sentado em casa ou caminhando pelo iceberg ele não sentia nenhum frio mais intenso que o que se sente nas sombras em um dia de verão.

Então havia, além de Dooni e Ux Loddhan, os feiticeiros de Thulask, outros cinco magos que seguiam a mesma viagem com Evagh, também escolhidos de Rlim Shaikorth. Eles também haviam sido temperados ao frio por Yikilth e suas casas também haviam sido transportadas para o iceberg por um encantamento desconhecido. Eram homens estrangeiros rudes, chamados de polarianos, vindos de ilhas ainda mais próximas do polo que a grande Thulask, e Evagh nada podia entender de seus modos, sua feitiçaria lhe era estranha e a sua fala era ininteligível, sendo tampouco conhecida dos thulaskianos.

Diariamente os oito magos achavam sobre suas mesas todas as provisões necessárias ao sustento humano, embora não soubessem por que meio era suprida. Todos se uniam na adoração ao verme branco e todos, ao que parecia, estavam razoavelmente contentes com seu papel e ansiosos pelo poder e pelo conhecimento extraterrenos que o verme lhes prometera. Mas Evagh estava intranquilo de coração e se revoltava em segredo contra sua servidão a Rlim Shaikorth. Ele contemplava com repulsa o destino cruel que recaía de Yikilth sobre adoráveis cidades e frutíferos litorais. Com raiva ele viu a destruição de Cerngoth, a florida, e a paralisia boreal que desceu sobre as ruas congestionadas de Leqquan, e a gelo que queimou com uma branquidão repentina os pátios e hortas do vale litorâneo de Aguil. E a tristeza estava em seu coração ao lembrar os barcos de pesca e as birremes mercantes ou de guerra que flutuavam sem comando depois de cruzarem com Yikilth.

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