Render-se à Jornada do Herói é Conformar-se

Veja bem. Há uma quantidade limitada de elementos possíveis na ficção. Cabe ao autor utilizar esses elementos de uma forma sábia, para construir uma história legal. Eventualmente você pode até descobrir um elemento novo, mas não veja isso como obrigação. Aqueles que propõem a Jornada do Herói como um paradigma obrigatório estão, porém, muito errados. Comecemos pelo óbvio: impor a Jornada como um método para construção de narrativas significa criar uma receita de bolo, abolir a criatividade do autor, enfiar todo mundo numa forma. Se […]

Chega de Histórias Machistas

Estamos em pleno século XXI e certas modas parecem não desaparecer de jeito nenhum, o machismo sendo uma delas. Mesmo na literatura, onde supostamente deveria imperar um tipo de artista mais crítico e mais hábil no manuseio de abstratos, o machismo segue dando as cartas. A Jornada do Herói e o Machismo Uma das formas pelas quais ocorre a perpetuação do machismo na literatura é a adoção servil da “Jornada do Herói” como um modelo padrão para toda história. Acontece que este é um modelo […]

A Beleza do Coronelismo a Gente Vê por Aí

A julgar pelo que ando ouvindo de comentários, na próxima segunda feira (depois de amanhã) estreará na televisão mais uma novela de época em que o canal [ainda] hegemônico tentará nos convencer que o latifúndio, o coronelismo e a pistolagem são coisas maneiras. Não é nenhuma novidade que a televisão — um meio dominado por umas poucas e poderosas famílias, aparentadas a tudo quanto há de mais retrógrado nesse país — tente fazer a hagiografia da estrutura de classes herdada do período colonial, o que […]

A Alienação no Processo Criativo

Os autores, especialmente os mais jovens, mas não somente eles, costumam reagir com certa amargura quando o tema “alienação” é colocado em discussão. A ideia de que o conceito sequer exista ou possa ser aplicado à literatura lhes parece ofensiva, como se alguns autores quisessem colocar-se em um pedestal moral — o que nunca é simpático. Essa reação instintiva ao conceito de alienação reflete uma dificuldade para refletir sobre o próprio fazer literário, que é, em grande parte, causada pela generalizada ignorância daqueles que querem […]

A Mulata Globeleza Não É Beleza

Este artigo é uma resposta a esta postagem no Facebook. Cobri o nome da pessoa porque existe risco de vergonha alheia. A ilusão da liberdade é uma das formas mais eficazes de perpetuar a servidão. Faça com que o indivíduo creia que suas escolhas são livres e ele se orgulhará de sua canga e morderá em quem tentar retirá-la de seus ombros. A mulata Globeleza deve ser combatida, sim, porque aquela mulher que ali está não é livre para escolher aonde pode estar. Quantas opções […]

Dos Livros Intermináveis e dos Leitores Abomináveis

Há obras que ganharam para si um status de obrigatórias. Isto praticamente é a morte para qualquer possibilidade de que sejam enca­radas como “divertidas”. Ninguém supostamente se diverte fazendo o que é obrigatório. Como eu, porém, tive a sorte de me apro­ximar da literatura como um selvagem, sem qualquer tipo de ori­entação pedagógica enquadrante, pude ler com prazer algumas des­tas obras e agora me espanto que sejam citadas em tal contexto. É recorrente a citação de listas de tais obras ilegíveis — parece haver certo […]

Bonitinha, Mas Ordinária — Um Filme que Explica o Brasil

Esta semana, na ressaca do feriado, assisti pela segunda vez um clássico de nosso cinema, baseado em obra ainda mais clássica de Nélson Rodrigues, o Anjo Pornográfico, nosso mais polêmico autor. Trata-se de uma obra que precisa ser melhor apreciada, embora o filme mesmo tenha envelhecido sob vários aspectos – e ainda que as polêmicas abordadas pelo enredo já não sejam tão relevantes no mundo de hoje. Digo que o filme precisa ser mais visto porque a obra de Nélson Rodrigues, cada vez mais, parece […]

O Método Asimov

O amigo João Gerônimo dos Santos se mostra espantado com um texto em que Isaac Asimov descreve o processo de criação do épico “Fundação”. Não pela sua dificuldade, mas pela forma como o autor o apresenta: sem *glamour* e sem divina centelha (também conhecida como “inspiração”). Para Asimov, o processo foi algo assim: Eu tinha um encontro com o Sr Campbell para conversar sobre o enredo de um novo livro, mas o problema é que, até a reunião começar, eu não tinha enredo nenhum preparado. […]

Ainda Será Possível Falar do Brasil?

Parece que o Brasil virou crime. É impossível falar do país que é nosso sem desagradar a alguém. Para toda tentativa de se abordar a história e cultura nacional haverá um grupo que se ofenda e que se defenda. É como se fosse preciso passar uma borracha sobre todo o tempo até ontem e começar a viver de novo em prol do amanhã. Qualquer coisa menos que isso será controversa. Minha percepção desse absurdo vem crescendo há algum tempo, mas o alarme soou quanto li […]

Colonização Cultural – Um Debate

Anteontem começou uma longa discussão no Facebook sobre uma tal “colonização cultural”. O ponto de partida foi um “meme” do Dr. House (um ícone cultural do colonizador, vejam só) com a frase seguinte: É de se imaginar o furor que a frase provocou, pois ela ataca a jugular dos jovens escritores brasileiros, sem lhes deixar chance de defesa. Nada afaga mais o ego juvenil do que a doce ilusão de ser especial, e nada o ataca com mais força do que a lembrança de que […]