Gente que Leio: Felipe Holloway

Esta semana tive o prazer de ler o mais novo conto deste jovem autor. Como de todas as outras vezes, me restou o queixo caído e uma profunda inveja. Inveja positiva, não essa inveja que tenta apagar o sol alheio que incomoda sua treva pessoal. Tive deixar-lhe um comentário, que aqui reproduzo.

Felipe, eu não preciso repetir o que penso de sua obra. Você sabe muito bem que, em certos momentos, eu quase tenho vontade de lhe pedir um autógrafo. Este conto foi um desses momentos.

Um autor se torna grande quando consegue escrever uma grande obra sem ter uma “grande” história. Um autor pequeno vai procurar escrever, no mínimo, sobre o fim da civilização ou a destruição até de um universo. Seus personagens precisarão ser fisicamente gigantes para esconderem a pequenez de sua alma.

Mas o grande autor não precisa de histórias ‘grandes’ e nem de ‘grandes’ histórias, ele engrandece as histórias que escolhe contar, mais ou menos como o músico habilidoso que pega um tema popular e o transformar em uma sinfonia. Não pense encontrar nada parecido com as Rapsódias Húngaras de Liszt no folclore da Hungria, nem que os caipiras toquem rabeca e viola como em uma bachiana de Villa-Lobos.

Esse seu texto é absolutamente um exemplo da razão pela qual eu acho que você é, ou ainda será, um grande autor. Não existe absolutamente NADA nele além de seu talento. Ninguém morre, ninguém nasce, nenhuma civilização desaparece, nenhum vampiro se transforma em lobisomem ou coisa parecida. Está o leitor apenas diante dos meandros de sua alma sofisticada e das histórias absolutamente banais, porém universais, que você capta no dia a dia.

Essa sua característica tem algo de Machado de Assis. Sua ficção evoca fortemente o melhor da obra machadiana no aspecto do romanceamento do nada ou do quase-nada. Se você não prestar muita atenção à leitura de Dom Casmurro poderá achar que é apenas a biografia de um resmungão que nada viveu. O mesmo se passa com esse seu conto, entre tantos outros: somente quem lê com talento (é preciso um certo talento para ler) perceberá as minuciosas mudanças e tragédias que ocorrem no fundo da alma dos dois personagens.

A incompreensão de seu protagonista também me evoca o Mersault, d’O Estrangeiro, que matou um desconhecido porque “o sol estava quente”. Este estranhamento do homem em relação à própria vida, e à alheia. Todos os seus personagens são absolutamente trágicos, mas não precisam matar e nem matar-se para isso: o modo como vivem é a própria tragédia.

Parabéns por este conto, e confesso que já estou começando inconscientemente a me tornar seu imitador.

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