Alguns Clichês

Este texto foi escrito nos tempos em que eu ainda não era persona non grata em certos círculos pseudo literários do Orkut, numa época em que ainda havia quem achasse que eu tinha conselhos a dar. Como nunca fui de bancar o padre e nem de fazer análise do sonho alheio, eu costumava usar de bom humor para provocar as reflexões que me interessavam. E de quebra, para justificar que lessem, eu botava de entremeio algum conhecimento extraído de minhas leituras ao longo da vida. […]

Improviso

O poema nasce, às vezes, como uma necessidade dos dedos. O toque deles contra as teclas, o prazer de ver as palavras formarem-se das letras, tornarem-se negras e deitarem-se na página. A frustração de retornar a apagar, o apego apertado de saber que o cursor retorna implacável condeno o erro a não ter havido. E aquele eterno temor de talvez haver algum perigo à espreita que destrua o arquivo, que delete inapelavelmente o esforço despencado em um verso. O poema, às vezes, nasce uma necessidade […]

Não Me Acusem

Não me acusem de saber muito, só porque tenho as mãos lisas. Não é que eu estudei a fundo, é que eu tenho tido outra vida. Porém não pensem que ignoro tudo que um homem deve. Minha vida inteira eu estudo, para algo certamente serve. Uns saem de casa, certos do saber e acham modos de moldar o mundo ao que Deus lhes disse antes. Eu saí ignorante e andei entre abismos e vazios. Quando cheguei aqui me estranharam. Não porque ensinasse, mas porque sonhava. […]

Carta a José

As lições que você ensina, José,1 há outros professores para ensinar, inclusive melhor que você e sem essa necessidade de autoafirmação que o leva a ofender os outros. O verdadeiro mestre não é o que humilha o seu aluno, mas aquele que faz o ignorante se sentir à vontade para aprender. Você não é um mestre, é um perdedor que se agarra a migalhas de conhecimento que obteve, procura fazer com que pareçam maiores do que são (independente do tamanho real que tenham) a fim […]

Um Desaparecimento

Hoje desapareceu um cara. Seu nome era Patrício Pinto, ou pelo menos era assim que o conheci. Bem, de fato eu não o conheci, apenas acompanhei sua carreira meteórica. Talvez mesmo “acompanhar” não seja o melhor termo: eu assisti, de longe apenas, a uma parte de suas estripulias. Tornei-me seu fã sem nunca tê-lo visto pessoalmente, admirei-o em cada palavra, mesmo sem saber quais palavras eram realmente suas e quais eram apenas repetições de palavras que outras pessoas haviam dito em outras ocasiões. Mas hoje […]

Dezesseis

“O Que Fazer Antes dos Dezesseis?” Pergunta-me alguém que sonha em tornar-se um grande artista quando crescer. Estranhei que a pessoa supusesse que eu saberia a resposta. Se eu soubesse teria sido eu mesmo um grande artista. Há certas respostas que não adianta saber tarde: não as testamos na hora certa, agora não saberemos se funcionaria mesmo aquele plano. Mas me pus a refletir sobre o que responder ao jovem de dezesseis anos que deseja ser um grande artista quando crescer. Olha, as pessoas hoje […]

Lacunas para a Imaginação Preencher

Gosto de textos que têm entrelinhas — que deixam na gente a expectativa de que há nas dobras das palavras um sentido oculto, um “apesar de você” que manda o governo à merda. Aprendi isso ouvindo Chico Buarque, percebi que na literatura isso é a carne que transformará o osso de uma história simples no corpo de uma obra que vale arte. Mas não gosto de textos que querem que “eu” imagine a história. Imaginar eu sei sozinho, até demais: há ocasiões em que me […]

Ghost Writers in the Sky

Judah Stevens ganhou os primeiros trocados escrevendo discursos para políticos e anúncios de xaropadas curativas no jornaleco local. Tinha sido bom em redação na escola e por isso o haviam recomendado a um cargo na Prefeitura, por influência de sua família relativamente influente. Com o tempo tornou-se o braço direito de ambos os partidos. Na calada da noite, como vampiros, homens de terno o procuravam com encomendas ilegais: “queremos discurso contra a privatização da rodovia”. No dia seguinte outros homens, de ternos iguais e voz […]

Apenas Teimo Ser Poeta

Meu problema é essa teima de poeta, de ser humano, de ter desejos que não cabem nos limites de beijos porque não beijas a inquietude que eu quero. E eu preciso interromper esta agonia de nada acalentar quando sonho. Sonho sim, e não me obedeço porque quero sonhar voos que não devo e é a tua mão que me amarra com amor e com afeto, com açúcar e veneno. Menti que a amava, agora peno consequências de um mal que planejei: a felicidade quieta de […]