Para Não Espelhar Seu Estilo

Há jovens autores que acreditam que um escritor deve, pelo menos ocasionalmente, abster-se de ler a fim de não “espelhar o estilo” de quem leiam. Avisem-me quem são esses autores para que eu nunca compre nenhum livro seu.

A criatura que evita ler para “para não espelhar um estilo” é muito ingênua e se encontra muito, mas muito equivocada.

Eu tinha usado um termo muito forte para definir essa pessoa, mas me policio para não ofender além do necessário. A verdade já dói bastante.

Os equívocos envolvidos são dois:

  1. Imitar o estilo não é algo ruim. Se você é iniciante, imitar o estilo de um bom autor é uma ótima coisa a fazer para aprender. Melhor ser um bom imitador do que alguém que faz lindas porcarias originais.
  2. Quanto mais lemos, mais referências temos, mais estilos diferentes conhecemos, mais desenvolvemos o nosso, próprio.

A pessoa que evita ler uma obra “para não espelhar um estilo” é como um ilustrador que não olha para ilustrações alheias a fim de não desenhar a mesma coisa, como um cantor que não ouve música para não espelhar o estilo vocal de outro, como o ator que não vê filmes para não espelhar a atuação de outros. Acredito que você já tenha entendido onde está o erro dessa ideia.

A primeira ilusão que o autor deve perder, a primeira, mesmo, é a da originalidade. Ninguém é um serzinho de luz parido por Jeová e com a missão de revolucionar a literatura. Ninguém traz dentro de o si uma dose derramada da Grande Garrafa do Talento Universal.

Você não é tão especial, seus amigos não são, eu não sou. Talento natural até existe, mas, se não for desenvolvido, atrofia-se. Sei disso porque eu mesmo atrofiei o meu talento de desenho por falta de prática. Já fui ótimo desenhista, hoje não sei fazer um ovo.

Todos estamos nesse mundo para aprender, e aprendemos com professores, não sozinhos. A humanidade não teria evoluído até onde evoluiu se cada nova geração tivesse de reinventar a roda. Subimos aonde subimos porque estamos sobre os ombros de gigantes, como diz a frase do Isaac Newton.

Eu sei que hoje em dia o sentido da palavra “humildade” foi invertido, mas ainda me prendo ao sentido antigo. “Humildade” é aceitar aprender. Esse negócio de não aceitar aprender com os outros e querer se desenvolver sozinho não é “humildade”, o nome disso é orgulho.

O orgulho é o pai do atraso na vida, e na arte.

Se essa pessoa que você conhece corre o risco de “espelhar um estilo alheio” só porque leu um livro, essa pessoa não tem estilo, nem personalidade. Ainda é uma esponja atrás de coisas para absorver, é imatura e insegura. Está ainda em aprendizado, e está se negando a aprender.

Vai passar o tempo, se fechará a janela mental da fase de aprendizado e ela não terá usufruído do benefício de conhecer a boa literatura, capturar boas influências e formar seu estilo. Por ter se recusado a subir nos ombros dos gigantes, essa pessoa “humilde” não alcançará todo o seu potencial.

Sei que serei chamado de “convencido”, de “prepotente” e de “sabichão” por dizer isso. Sei que serei. Mas ainda me sinto na obrigação de alertar a quem leia e tenha juízo: humildade não é isso.

E essa pessoa a quem você se refere é muito orgulhosa e equivocada, está se recusando a usar as oportunidades de aprendizado que a vida lhe dá porque, floquinho de neve que é, acredita que só há mérito se reinventar sozinha a literatura.

Diga-lhe apena isso: “Menos, por favor…”

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