A Superfície Jovem

Uma coisa que eu venho percebendo é que as letras de música escritas nas décadas passadas tinham muito mais maturidade. Artistas na casa dos vinte anos escreviam sobre temas complexos, abordavam dúvidas existenciais, tinham empatia com os mais velhos, consciência política… e faziam sucesso.

Quando você compara uma letra do Gênesis, por exemplo, com uma da Shakira você sente isso perfeitamente. As letras que Peter Gabriel, Tony Banks, Mike Rutherford, Steve Hackett e Phil Collins escreveram ANTES DOS 21 revelam conhecimentos (mesmo que superficiais) de literatura, música clássica, filosofia, política, mitologia etc. As letras da Shakira (ou de qualquer artista pop de hoje revelam o que?

Alguns dirão que não é justo comparar o Gênesis, que mesmo em seu auge era um grupo “de nicho” com uma artista pop como Shakira, mas será injusto comparar o Pink Floyd, que deteve por décadas todos os recordes de vendagem de um único álbum (*The Dark Side of the Moon*)? Que dizer de Beto Guedes ou mesmo de Milton Nascimento, que parecem já ter estreado velhos, cantando coisas densas como *Paisagem da Janela* ou *Travessia*?

Parece-me, isso sim, que vivemos em uma época que parece rejeitar a cultura, e que relega, por isso, ao esquecimento qualquer cantor ou autor que saia desse lugar comum obrigatório. Podemos não viver mais sob censura estatal, mas a sociedade, em geral, já não tolera discursos desviantes. A gente quase chega a se assustar com o fato de que provavelmente os Secos & Molhados teriam sofrido grande preconceito se cantassem hoje, talvez maior do que o que enfrentaram nos anos 70, com ditadura e tudo.

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